sexta-feira, 26 de junho de 2009

Paisagens Urbanas - Introdução


São Paulo é uma cidade incrível. Muita gente diz que a cidade é feia, que é uma massa cinzenta de edifícios. Isso é relativo, uma questão de ponto de vista. A priori, não é mesmo uma cidade bonita vista de cima, ao menos em grande parte de suas ruas. A beleza de São Paulo está nos detalhes, no olhar mais apurado, e estou falando de paisagens mesmo.


Vistas de imagens de satélites, a maioria das cidades lembra um câncer roxo na terra. As diferenças vão se acentuando à medida que se aproxima mais. No caso de São Paulo - uma megalópole de 1.522,986 km² sem grandes marcos aparentes de beleza - temos que chegar quase no nível do solo para encontrarmos o que buscamos. Mas afinal, qual é o nível do solo?

É nesse ponto que São Paulo se destaca, na topografia. Nem os grandes movimentos de terra que foram feitos ao longo do séc. XX conseguiram esconder os vales e morros, nem os edifícios espalhados pela cidade conseguiram bloquear todas as vistas. E não são poucas. Ainda que esses marcos topográficos não sejam explorados, senão como uma forma de se vender apartamentos cada vez mais altos com suas sacadas gourmet.

No centro expandido, temos o vale do Rio Pinheiros se juntando mais a frente ao vale do Rio Tietê. Entre eles, o espigão começando na Lapa e rumando em direção à Paulista, aonde segue em ligeiro declive para a Zona Sul. De um lado, às íngremes encostas caem para Alto de Pinheiros, Pinheiros, Jardins, Paraíso, Vila Mariana. Do outro lado, Alto da Lapa, Perdizes, Sumaré, Pacaembu, Higienópolis, Consolação, Boa Vista, Aclimação. Fora do centro expandido temos o relevo acidentado da zona norte em direção ao paredão da Serra da Cantareira.

Na outro oposto, o impressionante relevo da Giovanni Gronchi faz surgir e desaparecer vistas da gigante zona sul, que só termina na Serra do Mar. No centro, a bonita vista do vale do Anhangabaú revelando os primórdios de uma cidade de 455 anos, fundada numa colina escarpada entre os rios Tamanduateí e Anhangabaú.

Ninguém mais vê um porto na ladeira Porto Geral, ou tampouco as águas correndo pelo caminho da 25 de Março. Os magníficos meandros do Rio Pinheiros hoje podem ser percorridos em linhas retas, passando pelas usinas de traição que inverteram seu curso rumo à Represa Billings, que abastece a Usina Hidroelétrica Henry Border; co-responsáveis pelo desenvolvimento da maior e mais rica cidade brasileira.

Até a Casa Bandeirante do Butantã, um dos poucos marcos da arquitetura paulistana anterior ao séc. XIX ainda de pé, foi parar na outra margem do rio! Alguns marcos geográficos não são mais os mesmos da São Paulo antiga, mesmo numa história recente. O dinheiro e o desenvolvimento alteraram a paisagem, na maioria das vezes de forma definitiva. Mas também criaram outros caminhos, outros marcos e paisagens.

É fácil comprovar. Basta olhar para as encostas ainda verdes de Alto de Pinheiros e Alto da Lapa, de onde se pode ter uma vista panorâmica da cidade. Ou buscar o espetáculo que reúne tanta gente nos finais de tarde na Praça Por do Sol, com o olhar passando pela zona sul e Cidade Universitária para parar nas proximidades do Pico do Jaraguá, aonde o sol se esconde sob aplausos. Andar pelos caminhos íngremes e escadões da Vila Madalena e Perdizes, ou pela Vila Pompéia, incrustada num vale profundo. A magnífica vista do vale da Avenida Nove de Julho a partir das sacadas do MASP, comparável somente à vista da Avenida Sumaré sobre a – ou pela – estação de metrô de mesmo nome, que termina no mesmo longínquo paredão que limita a zona norte.

Cito as regiões do centro expandido, mas para as quatro direções encontramos vistas muito bonitas, conhecidas por poucos. Seja na casa Verde ou na Vila Sônia. Pela Zona Norte e Leste ainda podemos rumar pelos caminhos tortuosos que marcavam as antigas estradas que ligavam a São Paulo ao resto do Brasil, e não poucas vezes somos presenteados com vistas panorâmicas em mirantes pouco explorados.

Enfim, quando pensamos em São Paulo, esquecemos de lembrar que a cidade foi construída sobre uma riquíssima região de Mata Atlântica, permeada de morros, vales e rios, cercada por paredões de serras, riquíssima em marcos topográficos. Chamá-la de massa uniforme e feia é muito fácil para quem só sai na rua para entrar num carro, ou para quem acha que uma cidade só é bonita se termina no mar.

As paisagens de São Paulo aparecem e desaparecem numa velocidade muito rápida, escondidas entre edifícios e viadutos. Às vezes é preciso ir mais devagar, caminhando ou pedalando, prestando atenção, observando. O caminho entre sua casa e o trabalho pode ser muito mais interessante do que você pensa. Já tentou olhar?